Talvez você não saiba, mas apesar
de nunca ter exercido a profissão, eu sou formada em jornalismo. Não vem ao
caso o porquê de eu ter optado por nunca praticar o ofício e ter enveredado por
um lado completamente oposto, o da quase exatas. O mestrado de engenharia está
aí para mostrar que eu pertenço mesmo ao outro lado da força.
De qualquer forma, expus essa
informação apenas para dizer que, mesmo sem prática, tenho relativa propriedade
para falar sobre jornalismo. E a verdade é que eu acho que ele, o jornalismo,
pelo menos o brasileiro, faz um baita de um desserviço para a sustentabilidade.
Sorry quem se ofendeu, mas cabe a você e não a mim virar esse jogo. Corre que
ainda dá tempo.
Ao contrário do que algumas
pessoas acham, não acredito que a saída seja criar uma editoria temática nas redações. Em alguns jornais, canais,
portais, emissoras de rádio ela até existe. Alguns jornalistas até são
especializados em meio ambiente, mas, sinceramente, a questão não é essa. O problema é
falta de entendimento do conceito, de como ele funciona e a visão
multidimensional necessária para falar de sustentabilidade. Digamos que o
jornalismo seja 2d e sustentabilidade 3d.
Do pouco espaço que a pauta tem
na imprensa, quase sempre a informação é dada por alguém sem o menor
conhecimento do que seja sustentabilidade. Lembro da
vergonha alheia que foi a entrevista com o ministro do meio ambiente na
GloboNews na época da tragédia de Brumadinho. Um bando de jornalistas de
politica sem o menor preparo para fazer pergunta pro cara.
Nessa mesma época da tragédia,
durante a extensa cobertura, não teve uma viva alma, UMA VIVA ALMA, para
questionar a natureza da atividade de mineração. Todo mundo focou apenas no
óbvio, que foi a falha de segurança da Vale e o uso de uma técnica ultrapassada
na construção de barragens. Ninguém ousou questionar para onde vai o minério,
como ele impacta o meio ambiente, qual o seu papel no consumo desenfreado, o
que é feito dele depois do descarte...
Ain, Julianna, e o Trigueiro?
Cara, eu acho o Trigueiro um puta
jornalista, um papo excelente, tem muito conhecimento de meio ambiente, mas
falta a ele o que falta a todo e qualquer jornalista quando vai falar de
assuntos complexos: descer do pedestal e ligar o modo Ana Maria Braga de ser. Independente
de você gostar ou não do programa dela, na minha opinião de comunicóloga não
praticante, a sua maior virtude é ter a capacidade de falar com qualquer tipo
de público. Desde a classe Z até a dondoca sustentada pelo marido que às nove
da manhã já voltou da academia e está começando o seu dia.
Dos pouquíssimos jornalistas com
conhecimento para escrever sobre assuntos relacionados à sustentabilidade,
André Trigueiro incluído, o que eu vejo são eles falando para suas plateias. Que são a
minoria da minoria da minoria da população. Acontece que os fundamentos da
sustentabilidade não devem ficar restrito a um rincão elitista. É o que eu
sempre digo: somos quase oito bilhões de pessoas gerando impactos ambientais a
todos os momentos. É muita pressão pra um planetinha só.
E o que acontece é que a maioria
das pessoas não tem o menor conhecimento disso e qual deve ser o seu papel enquanto
cidadão responsável. O jornalismo de massa tem de ensinar isso. Mas ao contrário, já vi várias oportunidades perdidas em pautas de grande
interesse em que a falta de familiaridade do jornalista com o assunto e a tal da visão 3d mata a
sustentabilidade.
Por exemplo: nos momentos áureos
da nossa economia, vira e mexe o então governo fazia uma coletiva de imprensa
para anunciar a redução dos impostos para carro. Não tinha uma viva alma
questionando o impacto do aumento da circulação de automóveis na cidade, tanto
pela questão de trânsito, de tempo perdido, de qualidade de vida, de saúde, de
meio ambiente.
Outro exemplo foi a proibição dos
canudos de plástico. Todo mundo, TODO MUNDO, fez uma matéria sobre os materiais
substitutos. Nenhum, absolutamente nenhum jornalista se dispôs a questionar a
necessidade de se usar canudos. Nem o André Trigueiro (que eu saiba), que se
focou apenas em alertar para o perigo ambiental de usar canudo de plástico
oxi-biodegradável. Você sabe o que é isso? Pois é, foi ele, novamente, falando
para a sua plateia e não para um público médio.
A questão é que o jornalismo
deveria ter um importante papel social, ou melhor, dever social com a
sustentabilidade. Porque é o que eu sempre digo: ninguém precisa ter a
sustentabilidade como causa, mas todo mundo tem a sua cota de responsabilidade
com ela. Afinal, repetindo, somos quase
oito bilhões de pessoas gerando impacto todo dia.
Portanto eu pergunto para quem
exerce a profissão: onde estão as pautas de engajamento para o consumo
responsável, onde estão as pautas positivas, do tipo ficar sem comer carne um
dia na semana reduz X de emissões de gases do efeito estufa e X de consumo de
água? Porque ao contrário do que muito jornalista noticia, ninguém vai simplesmente
virar vegano por causa de peido de vaca. Então, entre criar a ilusão de que bilhões
de pessoas vão se alimentar de luz porque o planeta está ficando quentinho e
usar a mídia para realmente provocar uma mudança, o que você como profissional
de comunicação de massa está fazendo?