Uma das expressões mais “usuais”
do dicionário corporativês é o tal do business as
usual. Que, grosso modo, significa, fazer negócios como de costume. Isso
é praxe nesse mundinho e por mais que estejamos na sociedade do conhecimento,
na indústria 4.0 (já ouvi falar até da 5.0), a verdade é que as empresas fazem
de tudo para se manterem no business as usual
de sempre. Até mesmo as mais inovadoras. Porque na hora que o calo aperta, o
comportamento todas é padrão. Padrão ruim.
Vou dar um exemplo: Uber. Ain,
porque o uber está transformando o modo como as pessoas se relacionam com o
transporte, porque está dando oportunidade de todas as classes sociais poderem
usufruir de transporte individual de qualidade, porque dá oportunidade de renda
para pessoas com qualquer nível escolar e bla bla bla. Bullshit.
Você já experimentou a
infelicidade ter problema com algum motorista? Sabe qual é a resposta padrão do
Uber? Somos apenas uma plataforma que reúne os motoristas. O máximo que você
vai conseguir da empresa é que ela expulse o cara do sistema. Ponto. Agora
pergunto: se não fosse a plataforma deles, você teria pego aquele motorista? Pois
é. Então me responda: qual a diferença desse comportamento, para o da Nike,
quando ela disse, em 1995, ao ser acusada de trabalho infantil na Ásia, que a
culpa não era dela, mas do fornecedor?
Conforme escrevi no artigo da semana
passada, o ser humano é um bicho que nasceu para viver e morrer na zona de
conforto porque ele detesta mudança. Com as empresas é a mesma coisa. É preciso
ter alguém muito louco que tenha coragem de ser o primeiro a fazer algo
completamente fora do padrão para que a manada possa seguir o fluxo. A verdade
é que inovar é fácil, muito fácil. O problema é sair fora da caixa.
Por mais que as empresas vendam o
tal de “outside de box”, como se de
fato elas fossem, por mais que elas digam que querem contratar pessoas com pensamentos
disruptivos, a verdade bem verdadeira é que, repito, ser humano nasceu pra
viver e morrer na zona de conforto. E digo por experiência própria, se você for
uma pessoa assim, elas (as empresas) vão tentar a todo custo te enfiar dentro
da caixa. Mas enfim, papo para outro post.
O que, então, o business as usual tem a ver com
sustentabilidade? Na verdade, nada. Aliás, vou ser bem dura: a titulo de
sustentabilidade, o business as usual
pode até matar. E não, não estou exagerando. E explico. Lá atrás, quando
sustentabilidade era mato e as empresas tinham uma resistência absurda em
adotá-la (antes de chegar o primeiro louco e bancar o tema nas empresas), uma
das frases mais bizarras que eu ouvi foi que “sustentabilidade (ou responsabilidade
social, não lembro) para mim é cumprir a lei”. Quem disse isso foi um dos três bilionários
na Ambev (Telles,
Sicupira ou Lemann). Como não lembro quem foi, dou o crédito a
todos, porque, sinceramente, não seria estranho que qualquer um deles falasse
isso hoje. Que dirá 10, 15 anos atrás.
E o que eu quero dizer com isso? Quero
dizer que muitas empresas baseiam suas ações de sustentabilidade,
responsabilidade social e meio ambiente nas leis ou em um padrão de
comportamento do que é praticado no business
as usual. O que acontece é que, não raro, isso não é suficiente. Parece surreal
pensar nisso hoje, mas antes do atentado de 2001 nos Estados Unidos, era possível
viajar com objetos cortantes dentro de um avião. Precisou acontecer uma tragédia
desse nível para que o padrão “world
class” de segurança em aviões fosse atualizado.
É claro que nesses dois meses que
sucederam a tragédia de Brumadinho, novas informações foram acrescentadas à investigação
e há fortes indícios de que a Vale tenha manipulado os relatórios de segurança.
Mas não vou esquecer jamais o então presidente da empresa, Fabio Schvartsman,
dizendo que não entendia como aquilo poderia ter acontecido, já que a Vale
segue padrões mundiais de segurança.
Não vou entrar no mérito do desenrolar
da história e do que aconteceu, especificamente, em Brumadinho. Não é o
propósito deste artigo. Mas eu já estive lá dentro da Vale e afirmo com toda isenção
do mundo que sim, ela segue padrões mundiais de segurança. O que eu quero apontar
aqui é: os padrões de classe mundial de sustentabilidade NÃO são suficientes para a sustentabilidade.
Diversos são os motivos para que
isso aconteça. Um deles, e talvez o principal, é que há lobby fortíssimo por
parte das empresas para que os padrões sejam o mínimo do mínimo do mínimo. Lembram
o que eu escrevi lá em cima que nem pessoas nem empresas gostam de sair da zona
de conforto? É isso, meu caro. Outra questão também é que a nossa mente ser
condicionada à zona de conforto nos leva a tomar atitudes com base na reação.
A gente tem dificuldade enorme de
entender situações hipotéticas, principalmente quando elas estão ligadas a uma
série de variáveis. Sabe aquela situação mais absurda de acontecer, que ninguém
calcula a probabilidade porque ela está na categoria de impossível? Acredite em
mim, é com base nele que a gente tem de trabalhar a sustentabilidade. Não a
partir de dados estatísticos de ocorrências.
Porque esperar algo trágico
acontecer e a partir daí criar um protocolo de trabalho, é muito pouco para a
sustentabilidade. A gente está entrando
numa seara de escassez crítica de recursos naturais, de mudanças climáticas e
outras questões que não fazemos a menor ideia de onde isso vai dar. E a gente não
raro, acaba pagando com a vida, porque não consegue sair do modo reação para
prevenção.
Ain, Julianna, mas várias
empresas têm cultura de sustentabilidade fortíssima, super bem trabalhada e super
centrada nos colaboradores. Sim, tem. Padrão classe mundial, inclusive. Que,
como já disse não funciona para a sustentabilidade.
Na verdade, o que está faltando,
é fiofó para as pessoas e as empresas largarem o business as usual e darem o primeiro passo. Estamos sempre à espera
que seja o nosso coleguinha do lado a fazer. Ele não vai fazer. Então você também
não vai. E aí ninguém faz. E a gente passa a viver num mundo de faz de conta,
com o discurso de que sustentabilidade é premissa básica de qualquer empresa.
Bullshit.