O mundo passou por uma grave crise de 2008 até mais ou menos 2012, 2013. É claro que isso resvalou nas empresas brasileiras, mas a nossa crisona mesmo começou em 2014. Somado a isso, tivemos uma gangorra no preço do barril do petróleo e no preço do minério de ferro. Sendo o Brasil um país, fundamentalmente, de commodities, essa montanha russa pegou a gente de jeito. Sem contar a crise política e de valores que vai nos assombrar por um bom tempo.
Mas o que vem acontecendo na área de sustentabilidade das empresas não é apenas reflexo da crise mundial, da crise nacional e muito menos culpa do petróleo e do minério. Diria que é resultado de um processo de desaprendizado. Não estou falando isso com base em achismo. Eu venho sentindo na pele há uns bons anos. Nunca houve tantas contratações de profissionais da área pelas empresas e tantas portas abertas para consultorias de sustentabilidade como os anos de 2011 e 2012 e um pouco em 2013. Só que de meados de 2013 o sinal ficou amarelo. E não, não era a nossa crise.
Nos anos de ouro da sustentabilidade corporativa brasileira, o que mais me empolgou foi ver a possibilidade de as empresas fazerem menos projetinhos reativos e mais ações alinhadas às estratégias de negócios. A galera sangue nos olhos que eu tive oportunidade de conhecer e me relacionar tinha autonomia para fazer algo muito além do basicão da responsabilidade social e ambiental.
Mas aí o veio o tsunami. Quem se lembra da EBX anunciando o fim da área de sustentabilidade em pleno 05 de junho de 2013? Para quem não está associando datas, 05 de junho é o dia mundial do meio ambiente. E os passaralhos da Vale que acontecem todos os anos e deram fim às áreas que tratavam de questões relacionadas à inteligência para sustentabilidade? Sustentabilidade que hoje, para a Vale, é basicamente obrigatoriedades legais e GRI. Se bem que às vezes nem as obrigatoriedades legais são cumpridas, né, Mariana?
Outras empresas também demitiram pesado, outras diminuíram a influência da área de sustentabilidade e muitas, muitas, voltaram para o basicão de sempre. É muito frustrante! Isso sem falar no mercado de consultoria (consultoria no sentido real da palavra), que está completamente estagnado, a menos que você se sujeite a projetinhos sociais, ambientais e de relacionamento com comunidades. Ou seja, requisitos legais. Fico aqui confabulando com meus botões se o boom que teve anos atrás não foi apenas oba oba de Rio+20.
E aí eu me pergunto o que, de fato, aconteceu e está acontecendo com a sustentabilidade corporativa brasileira. Falar que a culpa é da crise e da queda das commodities é ser simplista demais. Volto à questão do desaprendizado dos últimos anos. Ou vou mais fundo: do próprio aprendizado.
Uma vez estava em mais um evento me engana que eu gosto (sou para-raio disso, só pode!) e tinha uma pessoa de sustentabilidade da Sabesp apresentando um projeto da área. O projeto era muito bom e eu fiquei interessada por ele. Como queria saber mais dados, perguntei o quanto a empresa tinha deixado de gastar e o que o projeto significava em termos de melhoria de negócio.
Mermão, eu devo ter xingado a mãe da pessoa, porque a reação dela foi como se eu tivesse ofendido alguém. E o pior ainda foi a resposta que tive: não medimos isso porque não é prioridade. A gente tem de fazer e então a gente faz. Juro que ela falou assim.
Você ficou horrorizado com isso, assim como eu fiquei? Vou dar uma notícia ruim: não se engane não, é como funciona a área de sustentabilidade na maioria esmagadora das empresas. Sim, falta muito entendimento das empresas sobre o é sustentabilidade de verdade, mas também falta nessa área muita gente com entendimento de negócios, com entendimento de planejamento estratégico, com atuação atrelada a indicadores, a monitoramento e controle, à análise de retorno.
Aí, quando uma empresa passa por problemas graves, quando a crise bate na porta e vem o financeiro fazendo um monte de corte, adivinhem onde eles vão reduzir gasto? Em áreas que não geram dinheiro, mas apenas reputação, ou que existem porque é o que a empresa tem de fazer. Tipo a área de sustentabilidade, sabe?
Então me pergunto: de quem é a culpa? Sim, a culpa é dos cabeças das empresas que têm visão tacanha a respeito da sustentabilidade. Também. E quanto a isso pouco pode ser feito em curto prazo, a não ser educar, educar, educar ou rezar para eles serem demitidos e entrar gente com visão boa pra isso no lugar. Mas tem outra parcela de culpa que é da própria área. Área esta que, na maioria das vezes, se comporta como se a sua obrigação fosse mudar o mundo pura e simplesmente.
Não sei se perceberam ou se eu deixei isso claro, mas sou uma pessoa que curte demais visão sistêmica e diversidade de experiências. Sustentabilidade permite atuar dessa forma e eu amo isso. É o cara de biologia, é o cientista social, o engenheiro ambiental, a pessoa de comunicação, a psicóloga, o assistente social... tudo junto e misturado e isso é sensacional. Mas mais que pessoas técnicas e com vontade de mudar o mundo, a área precisa de gente de business que queira aliar sustentabilidade a negócios para mudar a empresa e o seu entorno.
E aí não falo que a área necessariamente precisa de um administrador, um economista ou um engenheiro de produção. Mas necessariamente a área precisa que o cara biologia, o cientista social, o engenheiro ambiental e blá blá blá entenda a relação do seu trabalho com o negócio, que veja como pode dar retorno sobre o investimento, como a sua atuação está integrada ao planejamento estratégico e como o impacto que ela gera pode beneficiar a empresa.
Porque enquanto a sustentabilidade corporativa mantiver essa aura de pessoas felizes + somos amiga da natureza e não se posicionar como uma área que ajuda a empresa a melhorar o seu negócio, vai ser um dos setores mais suscetíveis a quedas em momentos de crise ou qualquer outra dificuldade. E como efeito cascata, vai contaminar toda a cadeia criada em torno da inteligência para a sustentabilidade, gerando um retrocesso de só se trabalhar respondendo requisitos legais e reputação. E não, isso não vai mudar o mundo.