quarta-feira, 14 de março de 2018

Quer trabalhar com sustentabilidade? Fuja da área de sustentabilidade!

Antes de começar a escrever, devo dizer que título não é uma ironia. Pelo contrário, ele é bem sério. É importante deixar claro que não estou falando de área que responde pelos requisitos legais da empresa, onde vamos encontrar pessoas formadas em biologia que vão trabalhar com condicionantes de biodiversidade ou engenheiros ambientais que vão trabalhar com recursos hídricos, por exemplo. Não estou falando do analista/ coordenador/gerente de meio ambiente. Falo do analista / coordenador / gerente / whatever de sustentabilidade.

Pouco importa a sua formação, a sua experiência ou o que você espera que seja a área. A verdade é que você vai se frustrar. Sabe por quê? A área de sustentabilidade é composta, basicamente, de (poucas) pessoas voltadas para projetos de engajamento, reputação, relacionamento e prestação de contas.

Ou seja, o que você vai ver na área são projetos sociais/ambientais/voluntariado, relacionamento com entidades tipo Ethos, CEBDS e ONGs, inscrição em prêmios de empresa mais sustentável do universo, programas de conscientização de sei lá o quê para colaboradores, ISE Bovespa se a empresa for listada em bolsa, CDP se ela tiver questões sérias com emissões de gases do efeito estufa, relatório de sustentabilidade, porque, afinal, vale mais reportar do que fazer, e eventos me engana que eu gosto onde você vai ver as mesmas pessoas falando sempre as mesmas coisas.

Além disso, a área tem como meta de vida pentelhar o povo de comunicação dia sim e outro também para colocar matérias dos projetos na intranet, no mural e no mailing. Se tiver moral, consegue até espaço no site corporativo. Depois de tudo isso, você mistura uma pitada de reunião de alinhamento, que é o momento onde você mostra pros seus pares e superiores imediatos tudo o que você fez no mês, na quinzena, na semana, whatever. E todo mundo sai feliz. Ou não. Acreditem em mim, isso é chato da porra.

É claro que coloquei uma lente de aumento e estou generalizando. Tem empresas que fazem um trabalho de sustentabilidade primoroso. Mas a verdade é que esse é o dia-a-dia da área de sustentabilidade da maioria esmagadora das empresas. É sério. É assim que funciona. A parte inteligente (e legal) da sustentabilidade fica, quando tem, ou na mão das consultorias, ou na mão das próprias áreas. E às vezes, ou melhor, na maioria das vezes, as áreas, sequer, sabem que o que estão fazendo é sustentabilidade.

Talvez, se a sua empresa for joinha, pode ser que você consiga rodar um projetinho de capacitação de sustentabilidade para fornecedores. E aí a área de suprimentos vai mandar uns 20 representantes dos mais de dois mil fornecedores que a empresa tem e você terá de se dar por muito feliz com isso.

Julianna, tô desenhando um super projeto de eficiência de consumo de água nas fábricas da empresa e quero vender pro meu chefe. Meu caro, se ele comprar, já que, dificilmente é escopo da área, é bem provável que ele tenha de vender para o gestor da fábrica. E se esse gestor comprar, quem vai tocar é a fábrica, não você.

Julianna, criei uma matriz pra fazer mapeamento de ações de sustentabilidade de todas as unidades da empresa e acho que vai ser sensacional. Meu querido, eu também acho, mas a menos que você tenha um chefe brilhante e vanguardista que vai te colocar pra fazer isso, você é pago pra fazer gestão da rotina. Nunca se esqueça disso. Gestão da rotina.

E se o chefe gostar, mas não for brilhante e vanguardista, ele até compra a ideia. E joga pra uma consultoria fazer. Porque é assim que funciona. A parte legal quem faz é consultoria. E cobra uma fortuna pra fazer o que você está seco pra fazer pelo seu salário. Que deve ser 10x menor que a fatura de serviços que vai chegar pro seu chefe assinar daqui a um mês.

Meus caros, sem rodeio ou floreios, essa é a realidade. Há um bom tempo converso com pessoas que estão na área e estão frustradas. Vejo um movimento contrário, com a galera querendo sair da sustentabilidade e buscar novos rumos para a carreira. A boa notícia é que eu acho que tem algumas alternativas e ninguém precisa desistir.

Alternativa um: vá para uma área funcional. Se quer trabalhar com sustentabilidade mesmo, vá pra operação, vá pra fábrica. Vá ver a coisa acontecendo no dia-a-dia. Vá pra longe da sua zona de conforto sem medo que a área corporativa te esqueça. Sustentabilidade não é feita no escritório com a bunda sentada em frente a um computador.

Alternativa dois: vá pra uma consultoria. Mas digo, não está um mercado fácil há uns bons anos. Passada a Rio+20 e com a crise do país, as consultorias especializadas estão estranguladas, já que a maioria das empresas acha que sustentabilidade é um custo que é cortado em momentos tenebrosos. Quando pinta um bom trabalho, geralmente é via uma das Bigs. Portanto, sugiro enviar seu currículo pra Accenture, EY, Delloitte, Price e rezar pra ter uma vaga aberta. Se você conhece alguém lá, o caminho pode ser mais fácil.

Alternativa três: essa é a que mais me chama atenção e é onde acho que pode dar mais caldo. Procure uma empresa cujo business tenha a ver com sustentabilidade. Empresa de energia renovável, empresa de construção sustentável (não confunda com empresa certificadora), empresa de tecnologias sustentáveis, empresa química (sim, empresa química!!) e bla bla bla. Dá uma olhada na área de novos negócios e veja se faz sentido.

E se nada fizer sentido, meu caro, desista de vez. Ou vire hippie.


P.S. Galera, no dia 14/04 em São Paulo, estarei conduzindo um workshop sobre mapeamento e gestão de stakeholders. Ele é bem legal e cheio de atividades práticas. Mais informações sobre conteúdo e inscrições: para contato@sustentai.com ou acessando o link: https://goo.gl/ueup7s


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