quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Sustentabilidade no setor bancário: mito ou realidade?

Um dos setores mais problemáticos de se lidar com a sustentabilidade é, sem dúvidas, o setor bancário. Olha que digo isso vindo de hard commodities, que é, por natureza, um setor altamente impactante ao meio ambiente. O problema do setor bancário é que, em termos de sustentabilidade, ele apenas surfou na onda porque é legal. Greenwashing quase que o tempo inteiro. Um setor que, independente do investimento em tecnologia e inovação, continua sendo gerido a partir de um modelo mental do século passado. E isso o torna insustentável.

Vamos analisar friamente: o que o setor bancário chama de sustentabilidade? Basicamente microcrédito, Princípios do Equador, ISE Bovespa, fundos de investimento verdes e atrelar a sustentabilidade a alguns de seus produtos de varejo. Parece muito, mas não faz cosquinha para banco algum.

Em 2013 ou 2014 (não me lembro), por exemplo, o Santander, que caiu de paraquedas em sustentabilidade por causa da compra do Banco Real, lançou um produto onde, se você financiasse o seu carro com o banco, ganharia a compensação de carbono dos primeiros 1000km rodados. Ou seja, ele não te engajava para mobilidade urbana, ele te patrocinava em engarrafamentos sustentáveis. Fora os dois carros que você pagaria só de juros com o financiamento.

No Brasil esse modelo mental retrogrado associado à insustentabilidade fica ainda mais evidente por conta de o setor bancário ser altamente regulado e com pouquíssima concorrência. Ao mesmo tempo em que Bradesco, Itaú e Santander estão na lista das empresas mais sustentáveis do Índice Bovespa, ao mesmo tempo em que por anos o Itaú foi líder do DJSI, eles estão no ranking das dez empresas mais acionadas na justiça, principalmente em processos do âmbito de código de defesa do consumidor. Tem alguma coisa aí que não bate, não é mesmo?

Pausa: Há muito, muito tempo escrevi sobre as incoerências do ISE Bovespa e elas continuam super atuais. A quem interessar possa: Qual o real critério para uma empresa ser listada em índice de sustentabilidade?

Fim da pausa.

Somada a essas incoerências do setor bancário, há outra ainda mais gritante. O princípio básico para a sustentabilidade corporativa é o win-win-win situation. A situação tem de ser boa para a empresa, para o cliente e para o entorno. Ou seja, para todo mundo. Aí eu faço o desafio: em que mundo um banco pode ter a cara de pau de falar de sustentabilidade quando cobra quase 20% de juros AO MÊS se você atrasar a fatura de um cartão de crédito ou usa o cheque especial?

Em que planeta o setor bancário tem a pachorra de se auto intitular sustentável quando cobra de uma empresa que foi pedir um empréstimo de 200 mil reais, 20 parcelas de 15 mil reais, totalizando 50% de juros na operação? P.S. Eu presenciei essa cena. Lembrando que empresa gera emprego, paga imposto, faz a economia girar e justamente no meio de uma crise, para sobreviver, é completamente extorquida por bancos.

Ou então, como ousar citar a palavra sustentabilidade quando uma pessoa CLARAMENTE humilde e sem conhecimento básico de finanças vai pedir informação sobre investimento (porque com o trabalho duro ela conseguiu poupar uma merrequinha) e o funcionário do banco empurra a ela um título de capitalização? P.S. Essa eu não somente presenciei, como intervi dizendo que iria denunciar o comportamento do funcionário ao Banco Central.

Na verdade esse tema me veio à mente porque com o anúncio do governo de permitir o saque do FGTS de contas inativas, os bancos, como sempre vampirescos, criaram produtos em cima dele. Na semana passada o Santander lançou uma campanha de antecipação do FGTS onde a pessoa pega um empréstimo e quita quando o dinheiro sair. Pergunto: você sabe quando vai sair? Não, ninguém sabe. Mais: nesse governo louco, ZERO CONFIANÇA, você assegura que esse dinheiro realmente vai sair? Nem eu, nem você, nem o Santander, nem Deus.

Mas o Santander está lá vendendo o seu produto sem explicar os riscos de você pegar esse empréstimo. Fora a taxa de juro abusiva que pode chegar a 4,59% ao mês. Aí imagina: você tem, por exemplo, 40 mil reais para sacar no FGTS. E por sorte, começa vai receber logo no primeiro mês do provável calendário, que é outubro. Numa conta vagabunda feita em papel de pão, diria que você receberá uns 28 mil reais.

Ou seja, em um adiantamento com, teoricamente, risco baixo, o banco ficou com mais ou menos 25% do seu dinheiro. Mas ele explica isso? Não. Porque se qualquer banco falar francamente de finanças básicas para os seus clientes, ele deixa de seguir a premissa do capitalismo do século XX, que é o de extrair o que der, pelo tempo que der, cobrando o máximo que puder dando o mínimo de retorno possível. Troque extrair pela palavra extorquir e você tem o sistema bancário vigente no Brasil.

Sustentabilidade nos bancos? Enquanto não vier uma startup fintech que chacoalhe o setor bancário como o Nubank chacoalhou o setor de cartões, digo o seguinte:  é MITO.


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