Desde o primeiro post deste blog,
e lá se vão quase oito anos, procurei mostrar uma visão sistêmica de
sustentabilidade, de como ela é calcada na relação causa x efeito e de como
essa relação nem sempre é direta. Até escrevi um texto especifico sobre isso há
pouco mais de um ano para que as pessoas nunca se esqueçam de como é básico. A
quem interessar possa, segue o link: http://www.sustentabilidadecorporativa.com/2016/01/a-relacao-de-causa-e-efeito-da.html
Trouxe essa informação de volta
porque hoje vou escrever sobre um tema que tem muito a ver com relação causa x
efeito. Um tema que sempre foi crítico e ao mesmo tempo sempre foi deixado de
lado na execução de políticas públicas do Brasil. É que não dá voto, sabe?
Então, vou falar de saneamento básico. Um assunto, digamos, bem pouco digerível.
Afinal, falar de cocô, lixo, esgoto e afins é bem desagradável.
Lá atrás, em janeiro de 2007, o
governo federal sancionou a Lei 11.445, mais conhecida como a Lei do Saneamento
Básico. O objetivo era estabelecer as diretrizes nacionais e a política
nacional do setor, universalizando o serviço no Brasil. Dez anos se passaram e
mesmo com a melhora nos indicadores, a situação ainda é calamitosa. Tipo,
saímos do extremamente ruim para o muitíssimo ruim.
O que significa para o Brasil,
ter, de acordo com a PNAD 2015, apenas 60,2% dos domicílios da região norte com
abastecimento regular de água, por exemplo? Ou então o que significa ter rede
de esgoto (por canalização ou fossa séptica) em 65,3% dos domicílios, sendo que
na mesma região norte a cobertura não chega a 25%?
Nem de longe sou especialista no
tema, mas posso dizer, sem sobra de dúvidas, o maior efeito da falta de
universalização do saneamento básico em um país: perpetuação de desigualdade.
Não adianta fazer política pública de transferência de renda, criação de cotas
e afins e não resolver problemas estruturais. Nós, Brasil, temos a péssima mania
de atacar o efeito, não a causa.
Para deixar claro o que estou
dizendo, tem vários estudos que apontam a relação entre saneamento básico e desempenho
escolar. Ou melhor, o impacto da falta de saneamento básico na performance
escolar das crianças mais pobres. O Eduardo Giannetti, um economista e filósofo
que eu adoro, é um que bate na tecla que grande parte dos principais problemas
da educação básica brasileira tem mais a ver com a má formação neurológica de
crianças por conta de doenças adquiridas nos primeiros anos de vida do que a
própria qualidade de ensino.
Muitas dessas doenças são
causadas justamente por contato com esgoto a céu aberto, corpos d’água poluídos,
falta de coleta de lixo e falta de acesso à água potável, causando deficiência
na aprendizagem. Assim, relegamos as crianças que vivem nas cidades/regiões
mais pobres do país, a um futuro de baixa escolaridade, subempregos e eterna
desigualdade. Basta ver a legião de analfabetos funcionais que o país gera ano
a ano.
Se não bastasse a tragédia
social e ambiental que ela causa, a falta de saneamento também acaba gerando profundos
impactos econômicos no país. Seja pelo custeamento da saúde pública para o
tratamento de doenças que não deveriam existir em pleno século XXI; seja no
custeamento da própria educação, por conta de elevado índice de repetência e
evasão escolar; seja pela necessidade de medidas paliativas de políticas de
transferência de renda como forma de minimizar a desigualdade abissal do
Brasil.
Então, por mais desagradável que
seja falar de cocô, água suja e lixo, é fundamental entendermos a importância do
saneamento básico para todos os pilares da sustentabilidade de uma cidade, de
uma região, do país inteiro. E mesmo não dando voto, é um assunto que já passou
do tempo de estar resolvido, pois seus impactos, além de cruéis, marcam a vida
de uma massa de pessoas fadadas à desigualdade.
Para quem se interessa pelo tema
e pelos dados de saneamento no Brasil, a Associação Brasileira de Engenharia
Sanitária e Ambiental lançou um estudo sobre isso. Para baixar o material,
basta clicar no link: http://abes-dn.org.br/?page_id=2525