Sustentabilidade não é um
tema fácil. Não é fácil porque não é óbvio. É muito mais do que plantar árvore,
infinitamente mais que projetos sociais e ambientais, e, obviamente, está muito
além de quem recicla o lixo. Para as pessoas entenderem a essência do conceito,
muitas vezes elas precisam abstrair. E, convenhamos, isso é difícil pacas. E
nem todo mundo consegue. Sabe aquela coisa meio efeito borboleta? Então, é tipo
isso.
Relacionando o conceito à
sustentabilidade, sempre costumo dar exemplo de que o aumento de um grau na
temperatura global pode aumentar, por exemplo, o indicador de violência em Nova
York. Ficou maluca, Julianna? Causa e efeito, meus caros, causa e efeito. Eu
disse que não era óbvio.
Vamos lá: qual será um dos
principais setores afetados pelo aquecimento global? Concordamos que é a
agricultura? Instabilidade no setor agrícola, chuvas ou secas constantes,
grandes perdas produtivas e financeiras vão fazer o quê? Jogar as pessoas do
campo para as cidades. E as cidades, principalmente as de países em
desenvolvimento, vão receber cada vez mais fluxo de pessoas (algo relativamente
parecido com o que está acontecendo agora na Europa).
Com mais gente nas cidades,
haverá uma pressão em serviços públicos de educação, transporte, saúde,
habitação, serviço social... assim como haverá pressão por mais empregos,
certo? Só que a conta não vai fechar, pois não haverá emprego para todo mundo.
E aí o que acontece? Aumento de roubos, furtos, violência...
Isso, meus caros, não vai
acontecer amanhã, nem depois de amanhã. É um processo. É lento. E por ser
lento, na rotina do dia a dia a mudança não é perceptível. Só nos damos conta
mesmo quando a coisa degringola de vez. É por isso que muitas vezes não
conseguimos fazer a relação direta de uma coisa com a outra. Mas é assim que a
sustentabilidade funciona. A sustentabilidade de verdade.
E do ponto de vista das
empresas, quais são os impactos não diretos da sustentabilidade? Para responder
a essa pergunta vou contar uma história dividida em duas partes, que já contei
aqui em posts distintos. O ano foi o mesmo, 2013.
Pois bem, em 2013 fui a um
evento de sustentabilidade e uma das pessoas da mesa redonda era diretora de
sustentabilidade de uma empresa de mineração. Fiz a seguinte pergunta: como a
empresa lida hoje com questões de sustentabilidade que podem impactar o seu modelo
de negócios em longuíssimo prazo, como, por exemplo a logística reversa? A
resposta: a preocupação da empresa com a sustentabilidade nos próximos 40 anos
diz respeito a esgotamento de minas e impactos sociais e ambientais da
atividade.
Juro. Diretora. De
sustentabilidade. Tenho testemunhas para quem não acreditar.
Nesse mesmo ano, apliquei
para o mestrado de engenharia de produção com ênfase em inovação na COPPE, a
escola de engenharia da UFRJ. O tema era justamente esse: o impacto da
logística reversa no modelo de negócios das empresas de mineração. Tirei notão
na prova, tirei notão na análise de documentos, mas eles detonaram com o meu projeto
de pesquisa. Recorri da nota e como resposta recebi que os avaliadores não
conseguiram identificar aspectos de inovação na minha proposta.
A proposta: pesquisar como
fatores como mudanças climáticas, economia de baixo carbono, regulamentações
governamentais, cidades inteligentes, etc poderiam criar condições para
facilitar a logística reversa, aumentando a oferta de minério reciclado a ponto
de reduzir a demanda por minério virgem, impactando o modelo de negócios das
mineradoras e forçando-as a uma mudança.
Entenderam a relação causa e
efeito?
E aí, apenas dois anos
depois, no final de 2015, me deparei com uma reportagem sobre a Suécia, cujas
empresas de mineração estavam mudando o foco e minerando materiais coletados
para reciclagem. Vocês conseguiram enxergar aspectos de inovação na proposta de
pesquisa que eu fiz para o mestrado e o que as empresas da Suécia estão
fazendo?
Assim como esse exemplo da
mineração, tem várias outras empresas e setores que parecem ainda não entender
a relação causa x efeito da sustentabilidade não em comunidades ou entornos,
mas nos negócios mesmo. Falo da maioria das empresas de petróleo, das empresas
que sobrevivem apostando na obsolescência programada, falo da indústria
automobilística que acha que sustentabilidade do setor é carro que liga na
tomada, da indústria de bens de consumo com a escassez da água e por aí vai...
E para finalizar esse texto
que está gigante, deixo algumas questões no ar: como as empresas tradicionais,
pesadas, burocráticas, lentas, repleta de pessoas com um modelo mental ainda do
século XX devem lidar com as verdadeiras questões de sustentabilidade? Como
mudar o modelo mental das pessoas que têm poder de decisão? Como fazê-las
entender a relação causa x efeito e impulsionar a sustentabilidade corporativa
para um novo patamar?