O tema sustentabilidade
corporativa não é novo, muito pelo contrário. Só esse blog tem quase seis anos.
Canibais com garfo e faca foi escrito há quase 20 anos. O Clube de Roma data da
década de 60. Não podemos esquecer as previsões trágicas de Malthus, lá em 1800
e bolinha. Mas mesmo não sendo nova, a sustentabilidade caminha a passos
lentos, muito lentos.
Apesar disso, ainda que devagar,
ainda que em crise existencial, ainda que em crise financeira, falar de
sustentabilidade pela ótica da melhoria de processos e da eficiência
operacional não é nada surreal. Plenamente aceita pela comunidade empresarial
nos dias de hoje, essa visão é fundamental quando atrelamos ganhos sociais e
ambientais aos ganhos financeiros.
E se a gente pensar que num
futuro de longo prazo, mais do que processos eficientes, a sustentabilidade pode
colocar em risco a presença de uma empresa no mercado? E se o fantasma da
escassez de recursos naturais e das mudanças climáticas tornarem-se realidade a
ponto de desestabilizar uma empresa sustentável? E se a maturidade da sociedade
reduzir a demanda de um setor de forma que comprometa sua viabilidade
econômica?
Perguntas do tipo: “o que
acontecerá com a agricultura caso a temperatura global aumente dois graus em
2020?” povoam a mente de pesquisadores e especialistas, pois a escassez de
alimentos é uma possibilidade real. Mas e pela ótica corporativa? Como uma
empresa de agronegócio tem de lidar, hoje, com a possibilidade de a oferta de
alimentos cair a ponto de o preço se tornar inviável à população? Ou então
forçar uma inflação que desestabilizará a economia de um país?
No nosso caso, somos um país,
fundamentalmente, de commodities, e este é um segmento bastante
suscetível aos impactos da sustentabilidade. Com a consolidação da logística
reversa, espera-se que haja aumento no descarte correto de resíduos, levando a
um aumento da reciclagem. Esse resíduo reciclado poderá ser utilizado pela
indústria de transformação, que, com isso, demandará menos matéria prima
virgem. E como consequência, a menor demanda de minério virgem, por exemplo, pode impactar o
modelo de negócios do setor mineração.
Outo fator importante, é que
somado a uma série de regulamentações governamentais, vemos um movimento,
principalmente na Europa, de cidades e sociedades se mobilizando em torno de
uma economia de baixo carbono. Lembrando que, atualmente, cerca de 80% da
energia primária consumida no mundo é à base de carbono (carvão, petróleo e
gás). Mas a tendência é mudar.
Além da energia renovável, o
investimento em pesquisa e inovação e design sustentável também vão
levar as empresas para esse caminho do baixo carbono. A formação de mercado
para produtos como biopolímeros e biocombustíveis de segunda e terceira
gerações, por exemplo, podem impactar em longo prazo o setor de petróleo e gás
de forma que a demanda pela matéria prima se reduza naturalmente. Isso porque
nem estou falando de fatores políticos!
Mas não serão apenas as empresas
de commodities as únicas cujo modelo de negócios pode ser impactado pela
sustentabilidade. Mudanças climáticas, escassez de água, esgotamento de matéria
prima e a própria maturidade das sociedades pressionarão empresas de bens de
consumo a uma nova postura corporativa aliada à necessidade do desenvolvimento
de produtos completamente inovadores. Saí de cena a inovação alcançada pela
melhoria de processos e entra a inovação alcançada através de uma nova forma de
se utilizar os produtos.
Somado a esses fatores, o consumo
mais responsável demandará uma nova postura corporativa, culminando no redesign
de diversos tipos de empresas. Empresas estas que precisarão se reinventar em
uma sociedade que dará menos espaço para a obsolescência programada e para o
consumo desenfreado. Com isso, elas serão impelidas a buscarem um modelo de
negócios que promova a transição de uma empresa de produtos para uma empresa de
serviços.
Pensar e planejar em muito longo
prazo é algo extremamente complexo e difícil. A possibilidade de praticar o
exercício de futurologia é grande. Mas a questão é que os cenários apontam para
um caminho completamente oposto ao que vem sendo praticado pelas empresas hoje.
Empresas estas ainda funcionam com uma mentalidade de empresa do século
passado.
Acontece que quando diversos
problemas ou restrições ocasionadas pela sustentabilidade eclodirem de verdade,
as empresas precisarão estar prontas para um novo modelo de gestão. Só que essa
transição é lenta, muito lenta. E para o cenário ganhar contornos ainda mais
dramáticos, quando isso acontecer, a sustentabilidade não será vantagem
competitiva ou possibilidade de ganhos financeiros. Ela será questão
de sobrevivência.