Para não ficar no campo da utopia
e do faz de conta, antes de nos perguntarmos como seria um mundo sem petróleo com
as atuais necessidades energéticas, devemos nos perguntar se é possível. E aí
vem a resposta que pode incomodar muita gente: sim, é possível. Por mais que
possa parecer improvável.
Em Reinventando o fogo – soluções
ousadas de negócios na nova era da energia, o físico Amory B. Lovins (sim, o
autor da bíblia Capitalismo natural!) mostra como, até 2050, os EUA podem se
livrar do petróleo, do carvão, partir para uma economia de baixo carbono e
criar um mercado energético muito mais estável e com muitos empregos. Ou seja,
um novo modelo de negócios.
Milagre? Não, basicamente
eficiência no consumo de energia, tecnologia, inovação e formação de mercado. É
claro que isso, de forma alguma, é simples e barato (mesmo que, comprovadamente
compense ao longo dos anos). Mas é aí que Lovins e o Rocky Mountain Institute
mostram o que pode ser feito. O livro fala da importância do smart grid, da construção
sustentável, das cidades e dos transportes inteligentes, da importância dos
biocombustíveis, principalmente o etanol de algas (alô, Solazyme!)
Os EUA são o país que mais
consome petróleo no planeta. Atingiu o pico na década de 70 e desde então
importa uma quantidade de petróleo maior do que a sua produção. Acho que em
2012 ou 2013, pela primeira vez em muito tempo, a importação foi menor. Não
identifiquei a causa, mas suspeito: shale gas. Em português: gás de folhelho. Para
os leigos: gás de xisto. Ou seja, não que a demanda energética tenha diminuído;
apenas entrou em escala de produção uma fonte alternativa. Tão ruim para o meio
ambiente quanto.
E aí, é claro que o livro entra
num tema bem espinhoso. A economia americana do século XX se formou em torno de
gasolina barata, mesmo quando houve a crise do petróleo, mesmo quando o barril
saiu de 31 dólares em 2001 para mais de 100 dólares atualmente. Um litro de
gasolina nos EUA é mais barato que 1 litro de leite. Pergunta: como o país
consegue manter um preço tão baixo diante de tanta instabilidade econômica,
política e de segurança no setor?
A palavra-chave chama-se lobby. O lobby para o
setor de petróleo e gás faz circular anualmente nos EUA mais de trezentos
milhões de dólares. Em troca, a gasolina americana é altamente subsidiada. Em
termos econômicos isso significa que o governo americano financia o setor às
custas de muito déficit orçamentário e empréstimos externos. E mexer nisso é um
vespeiro.
Imagina a cena: você é um cidadão
americano médio, tem o seu utilitário (que roda, em média 4 litros/km), mora
naquelas casas lindas no subúrbio, a 20km do seu trabalho. A relação de
urbanismo que você tem com a sua cidade é de total dependência do transporte
individual. Agora pergunto: você gostaria de pagar o preço real da gasolina? E
olha que nem estou falando das externalidades! Falo apenas de um preço onde o
governo não coloca um centavo de incentivo.
Reinventando o fogo cita muitos
dados técnicos, muitos dados econômicos, mas os autores têm perfeita consciência
de que, para alcançar a proposta de um mundo economicamente viável sem a
presença do petróleo, mais do que projetos para eficiência no consumo de
energia, uso da tecnologia, da inovação e formação de mercado, vai ser
necessário tirar muita gente da zona de conforto. Você toparia?
Reinventando o fogo – soluções ousadas de negócios na nova era da
energia
Autor: Amory B.
Lovins e Rocky Mountain Institute
Editora: Cultrix / Amana-Key
* A Editora Cultrix, que publicou
o livro no Brasil ano passado, criou um site com uma proposta muito
interessante e ousada: como seria um livro no espírito de “Reinventando o fogo”
escrito para a realidade brasileira? E chama a galera para participar do
projeto. Eu, por exemplo, já me inscrevi. É uma obra muito coletiva, muito
colaborativa e muito necessária. Aos interessados, o link para se inscrever: http://www.amana-key.com.br/reinventando/movimento.html
** Precisamos de voluntários para
testar o sustentAPP!! Mais informações: http://goo.gl/tqVsS9