quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Por que as empresas dão tanto valor aos relatórios de sustentabilidade?

Quem acompanha esse blog sabe que não sou lá muito fã de relatórios de sustentabilidade.  É claro que acho que deve haver uma prestação de contas pública a respeito das ações de sustentabilidade. Mas acho que relatório é nada mais do que isso. Prestação de contas. Ponto.

Acontece que para muitas empresas, o relatório ganhou um protagonismo que, para mim, não faz o menor sentido. Em tese, repito, ele é apenas a prestação de contas daquilo que foi feito. DAQUILO QUE FOI FEITO. Relatório não passa da ponta final de todo um processo de gestão de sustentabilidade. Por que tanto cuidado com o final se o meio e o início são, simplesmente, relegados a um segundo plano?

Sinceramente acho que pouco deveria importar a metodologia de coleta de dados (sério, isso é simples demais para a montanha de dificuldade que as empresas dizem ter nessa ação) ou em qual versão GRI o relatório é baseado. Mais sinceramente ainda, é um documento que pouca gente lê. Sem contar que a forma como os indicadores são reportados hoje não despertam nenhum interesse do mercado financeiro.

Conheço empresas que cobram R$ 200.000,00 (e muitas vezes até mais) para escrever um relatório. ESCREVER. Conheço empresas que mal fazem sustentabilidade e criaram uma gerência de GRI. GERÊNCIA. Com direito a analistas e suporte de consultoria. Conheço universidade que criou linha de pesquisa de mestrado/doutorado para GRI. Imaginem, sofrer que nem um cão num mestrado para no final escrever uma dissertação sobre a importância de relatar o que as empresas fingem que fazem para um mercado que finge que acredita.

E aí pergunto: para que tanto investimento, não apenas financeiro, mas principalmente de tempo, de esforço, de estratégia corporativa para um mero relatório de sustentabilidade? Será que ele é mais importante do que colocar em prática a sustentabilidade dentro de uma empresa?

Não, não é!

O que acontece é que preocupadas basicamente com reputação e de olho no que seus pares fazem, as empresas investem na construção de relatórios que beiram a ficção. Sim, porque o que se tem hoje são relatórios que contam uma história onde acidentes não acontecem, onde conflitos sociais são problemas de fácil solução, onde fauna e flora não são impactadas pelas operações industriais, onde as emissões não contribuem para as mudanças climáticas e, principalmente, onde as externalidades são apenas externalidades.

E com um monte de livros de ficção (sim, relatórios com mais de 80 páginas em tamanho A4 são livros, convenhamos!) publicados anualmente, as empresas vão fingindo que fazem sustentabilidade. Não, elas não fazem. Muito longe disso. Inclusive empresas com relatórios impecáveis são verdadeiramente insustentáveis.

Acho que está na hora de sairmos da fase de enrolação e amadurecermos de fato a sustentabilidade dentro das empresas. O ano de 2013 foi particularmente ruim para quem é da área, seja pelas muitas demissões, seja (para quem trabalha com consultoria) pela falta de projetos estratégicos (sempre aquele basicão de condicionantes ambientais/sociais) e seja, principalmente, pela (falta de) profundidade do discurso de sustentabilidade corporativa. O fato é que, passado o oba-oba da Rio+20, nós regredimos. E regredimos feio.


Mas como não costumo desistir no meio do caminho e muito menos me entregar ao que é mais fácil, proponho, aproveitando que 2014 ainda está no início: que tal pararmos de pensar um pouquinho em relatórios, GRIs, G4 e afins e começarmos a praticar sustentabilidade corporativa de gente grande? 

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