sábado, 5 de setembro de 2009

Desculpa social?

Falar de sustentabilidade corporativa envolve não apenas questões sociais, ambientais e financeiras ou mudança de cultura e valores. Envolve, também, reputação. Há pouco mais de dois anos, a Market Analysis fez uma pesquisa cujo tema era qual empresa o consumidor considerava mais socialmente responsável. Essa pesquisa apontou Petrobras, Nestlé e Coca-Cola como as empresas que mais tratam da responsabilidade social na percepção dos consumidores e colocou a Souza Cruz como uma das que menos faz.

O resultado traz à tona uma questão muito interessante: por que, quando se fala em indústria tabagista, as pessoas não conseguem dissociar a conduta da empresa do produto que ela comercializa? Não estou defendendo a Souza Cruz nem criticando o resultado da pesquisa, mas analisemos: a indústria de bebidas é tão controversa quanto a indústria tabagista e não vejo críticas para a Ambev nesse sentido (pelo contrário, ficou em oitavo lugar). Os impactos ambientais e sociais causados por mineradoras e empresas petrolíferas são infinitamente mais profundos e mesmo assim a Vale e a Petrobras são as duas empresas mais admiradas do país.

Fumar faz mal? Muito. Eu, particularmente, odeio cigarro. Mas não podemos ignorar que é uma escolha pessoal associada a riscos. E quantas escolhas de risco fazemos ao longo da vida? Você adora os chocolates da Nestlé ou não consegue resistir a um sanduíche do MacDonald’s? Segundo a OMS, a obesidade é a epidemia global do século XXI, sendo responsável pelo segundo maior número de óbitos passíveis de prevenção. E em relação à bebida, quantas pessoas inocentes morrem no trânsito todos os anos por culpa de outros que dirigem alcoolizados?

Entrando no segmento de serviços, recentemente o Bradesco e o Itaú-Unibanco foram considerados os bancos mais sustentáveis da América Latina. Você tem noção da taxa de juros cobrada por essas e qualquer outra instituição bancária no país? Experimenta ficar um ano pagando apenas o valor mínimo do cartão de crédito e depois me diga se a sua dívida é sustentável.

Apesar de polêmicos, todos esses produtos que eu citei: fumo, bebida alcoólica, chocolates, sanduíches gordurosos e juros extorsivos são perfeitamente legais. Do ponto de vista jurídico as empresas não estão fazendo absolutamente nada de errado. Em meio à toda controvérsia, o que eu acho que as pessoas podem fazer, caso se sintam incomodadas, é lutar com seus congressistas por leis mais restritivas, e, quando for o caso, punição por desrespeito às que já existem.

Em minha opinião, o produto comercializado (desde que legal) tem menos importância que a forma como a empresa conduz seus negócios. Eu estou mais interessada em saber se os funcionários trabalham em um bom ambiente, se são respeitados, se a cadeia produtiva é sustentável, se a forma de negociar da empresa é justa com todas as partes, como é a relação dela com as comunidades, se o relacionamento com as esferas governamentais é sadio, como os impactos ambientais são mitigados, se a empresa é ética, se é transparente com seus stakeholders... Desculpa social? Para mim não.

6 comentários:

Unknown disse...

Ju, acompanho seu blog e a Comunidade Trainee Brasil e sempre acho fantástico seus comentários, com a única exceção deste caso.

Nem vou discutir se acho certo ou não trabalhar em indústria tabagista / alcool ou coisa do tipo, só acho que esse assunto é idêntico a religião, afinal, cada um tem seus valores próprios e, mesmo com 1001 argumentos, uma pessoa com opinião contrária nunca iria mudar de ideia.

Se esse assunto for discutido, deve ser feito com muita cautela. Não acho certa comparar as diferentes indústrias (como comparar Souza Cruz e AmBev, as "vilãs" da história com indústrias alimentícias ou de carro, por dizerem que carro mata tmb), afinal o foco e atuação de cada setor é totalmente diferente e, na minha opinião, compara-las não tem cabimento.

Eu, por exemplo, nunca trabalharia na Souza Cruz porem trabalharia sem problemas na AmBev. Isso é certo, errado, ridículo, eu sou idiota, sem critério, inteligente?? NEHNUM DESSES, são meus valores que determinam isso.

Acho algo falho da Souza Cruz não divulgar eficientemente os fatores "extra produto" que ela tem, como suas ações sociais e projetos de sustentabilidade, os quais a empresa investe milhões. Hoje, não importa o que ela faça, todo mundo (os que não gostam dessa indústria) só vai pensar: "Vocês fazem cigarro, são um bando de causador de câncer, não quero nem te ouvir". Acho que a Souza Cruz devia investir muito em publicidade, com foco na divulgação em seus projetos sociais, sem citar uma vírgula do produto que ela faz (que não interfere em nada). Ainda mais uma indústira tabagista, que não prejudica apenas o seu usuário, mas as outras pessoas ao redor que não fumam e inalam a fumaça do fumante.

Algo que na minha opinião falta em muitas grandes empresas são ações sociais e de sustentabilidade relacionadas ao produto final que comercializam.

A AmBev, Fensa e Schin pra mim não devem apenas dizer "Se for beber não dirija" ou "Menores pra 18 anos", isso são coisas óbvias e que servem como desculpa, deveriam promover campanhas relacionadas ao consumo errado do alcool, como por exemplo uma campanha sobre a violência contra a mulher com o intuito de concientizar as mulheres e estimula-las a prestar queixa e usufruir dos seus direitos. Ou até divulgar o AA.

Assim como a Souza Cruz não deve apenas falar: "Não fume, isso faz mal" ou "Não vendemos para menores de 18 anos" bla bla bla. Deveriam promover campanhas relacionadas à saúde, ou investir em pesquisas de cura ou de medicamentos do câncer (não sei se fazem isso, mas deveriam, afinal é até ótimo para os negócios dela).

Continue com este ótimo blog Juliana

Abraços

Rafael

Alessandra Colla Soletti disse...

Muito bom esse blog! Parabéns!
Gostaria de ver uma matéria sobre Teletrabalho Sustentável (o Trabalho Remoto sustentável). Trabalhar remotamente contribuir para a diminuição da emissão de CO2 entre outros benefícios (ser economicamente viável e socialmente justo). Sou Diretora de Marketing da Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades (www.sobratt.org.br) e, caso queira, estou à disposição para uma entrevista sobre o assunto.

Abraços,
Alessandra

Julianna Antunes disse...

Alessandra, ótimo tema! Inclusive, é uma tendência do mercado de trabalho. Poderia me mandar um e-mail com seus contatos para que futuramente eu possa fazer um bate-bola e incrementar o assunto?

Bjs e obrigada pela dica e disposição em ajudar.

Anônimo disse...

Sugiro vocês a olharem com um pouco mais de atenção antes de criticarem as empresas em debate:

http://www.souzacruz.com.br/OneWeb/sites/SOU_5RRP92.nsf/vwPagesWebLive/80256DAD006376DD80256D87006B91F4?opendocument&SID=&DTC=

Thiago Machado disse...

Olá Juliana. De fato este é um tema delicado. O que seria importante para a nossa sociedade, o produto que as empresas oferecem ou seu modelo de gestão?

Particulamente acredito que os dois são imprecindíveis, e para tal devem estar associados as regras estabelecidas em nossa sociedade, enfim, as leis. Cabe, portanto, que um debate sobre aquilo que deve ou não ser permitido (legalização da maconha, fumo em locais públicos, lei seca, etc.) cabe a sociedade, competindo aos responsáveis por tais determinações e aos planejadores das políticas públicas de saúde, segurança, educação, etc, que promovam uma regulamentação que condiza com os interesses sociais.

Contudo vejo com bastante desconfiança a RSE de uma empresa que cujo produto causa tantos males. É uma forma de minimizar sua imagem negativa, promovendo uma suposta contrapartida, que no fim das contas não paga o preço das consequencias que tais produtos causam.

Julianna Antunes disse...

Thiago, a questão é que você só olha pelo lado da imagem. Sustentabilidade corporativa é muito mais do que isso, é administração, planejamento estratégico.

E quanto às consequencias dos produtos, todos nós, fazemos escolhas que envolvem riscos. Fumar ou não é apenas uma delas. O que não pode é essa indústria ser a única com o estiga. Todas as empresas causam algum tipo de impacto ao meio ambiente e à sociedade.